BIOGRAFIA
Final
do século XIX, no dia 13 de maio de 1888, em pleno dia onde extingue-se a
escravidão no Brasil.
Uma
menina, filha de escravos já alforriados consegue sobreviver a um parto
extremamente difícil que acarreta na morte de sua mãe, Antônia.Os donos da
Fazenda Progresso, o Barão Heleno de Bourbon primo em segundo grau da família
da corte francesa, agraciado em bens e sua esposa a Baronesa Belina, que jamais
conseguiram ter filhos, haja vista que os que nasceram foram natimortos. Sempre
conhecidos por ser tão solícitos aos seus criados, porque foi um dos pioneiros
a reconhecer o trabalho e pagar em moeda corrente pelos préstimos daquele povo
africano. Decidiram para o assombro de toda comunidade Carioca da época adotar
como filha menina que nascera naquele dia, chama-la de Hangra Reis do Brasil
sobrenome que os pais adotaram quando aqui chegaram da África.
Hangra
Reis fora uma homenagem que a Baronesa desejou fazer ao vilarejo Angra dos Reis
- Estado do Rio de Janeiro, que tanto amava e que para si o local que mais
dignificava o solo sagrado brasileiro. Hangra recebeu a melhor educação que o
poder aquisitivo da época comportava, no entanto, muitas vezes esbarrou no mesmo
contexto:
O
preconceito Racial.
Era
intolerável para a sociedade aristocrata da época aceitar um casal de senhores
feudais ter como filha além de adotada também negra.Contudo, isso jamais
impediu a menina que virou adolescente e então mulher, dominar seis idiomas,
completar os estudos, formar-se com louvor em direito inda que tivesse que
assistir algumas aulas no fundo da sala com dois metros de distância da
penúltima fileira por exigência dos demais pais e mestres e sendo a única
mulher e negra dentro da sala.No entanto, em seu coração ela incansavelmente
teve o mesmo ideal, investigar casos cujos não havia explicações ou era
absurdamente abafados dadas as circunstâncias ora política ora socioeconômica
dos indivíduos envolvidos.
Seu
pai era reticente quanto a isto, no fundo o Barão julgava que filha conseguiria
uma vez sendo mulher e principalmente negra.Após a morte de Belina, sua mãe,
ele também logo sucumbiu deixando todos os bens para sua única herdeira,Que
vendeu a propriedade, e atirou-se a sua jornada crendo que essa era sua sina e
paixão.
Hangra estava prestes a despertar em sua mansão
no bairro do Catete no dia 23 de fevereiro de 1908 quando um estrondo rompeu o
silêncio não só da jovem investigadora como também dos demais moradores de sua
casa.
—Homessa!—gritou batendo na cama. — o que foi
isto? — erguendo—se pondo o penhoar sobre sua camisola.
Bento veio logo batendo na porta de seu
aposento tomado pela preocupação:
—Hangra! Hangra vosmicê está bem?
Imediatamente a silhueta da bela dama negra fez
o coração do apaixonado Valentim sossegar.
—Graças a Deus!— pondo a mão sobre o peito e
logo atropelado por ela e suas perguntas com aquele tom autoritário implícito:
— E Donana? Repousou os olhos nela Bento? Jaze
bem? Por que me tomas! Anda homem e me ajude a saber dela e dos demais! — Essa
era Hangra Reis do Brasil, uma mulher à frente de seu tempo e de seu mundo.
Foi no pequeno aglomerado na sala que soube que
não somente Donana, como também os demais que com ela viviam e trabalhavam
estavam todos, sem exceções a salvo.
—Pelos céus, que chongas foi essa?— reclamou
Bento coçando a cabeça enquanto Hangra ia se direcionando de onde o estrondo se
originara e foi lá que gritou em alto e bom som:
—Achadego! — expressão usada para coisas
encontradas. Todos reuniram-se a sua volta, saindo do fundo da lareira com uma
espécie de pacote.
—Mas que baraço é esse? —indagou Vicentin
aludindo ao tipo de nó que se dava ao enforcado.
—Ave Marias, depois das... — rebateu Donana
fazendo sinal do sino para rezar 3 vezes.
Hangra serena como sempre abriu espaço indo até
a mesa da sala de jantar e abrindo cuidadosamente a tal encomenda e logo que
repousou os olhos negros como jabuticabas maduras suspirou profundamente e
arguiu:
—A-la-mar com certeza! — outra expressão da
época para algo que ia além mar, além de nossa compressão. Lá havia uma carta e
um desenho impresso numa espécie de papel cartão. Alguém jogara aquilo em sua
casa.
—Hangra!
—reagiu o parceiro. — Como pode esta mulher estar falando a verdade? –tomando o
quadro com a pequena bailarina disparou:_ me parece um bem de raiz não é
qualquer um boquirroto que tem condições de mandar pintar um quadro de um filho
a óleo inda mais em aulas de balé!
—E
se ficar aqui parara ouvindo suas conjecturas boçais saberei quando e onde está
a verdade senhor Bento Vicentin? — arqueando a sobrancelha esquerda, um jeito
muito peculiar de evidenciar sua insatisfação.
O
moço saiu umas pisas duras e tratou de fazer o que lhe fora imputado.
Donana
só esboçou um sonoro:
_Elaiá!
Uma
hora e meia depois Hangra Reis acompanhada por Bento e às turras de seu cenho
aportaram no endereço do bairro afastado e carente da Capital carioca.
—Desejo
estar com a senhora Judith Braga.— disse a moça sendo ignorada pelos poucos que
passavam, o preconceito não era elitizado, mesmo os menos favorecidos eram
submergidos e impregnados por ele. Ali, a sua frente, jazia uma negra livre,
com roupas de brancos, com posses e voz altiva.
Bento
a fitou querendo tentar, e logo que fez o mesmo alguém gritou:
—Pensão
acima, vire a esquerda!
A
jovem investigadora retrucou em alto e
bom som:
—Se
talhar meu braço o sangue é de cor vermelha, há alguém aqui que possui um de
outra cor? —Hangra sussurrou entrando na carruagem: Agradecida Bento.
—Por
nada.
—Eu
creio que haverá um dia neste país que uma pessoa de bem não será julgada pelo
seu credo, por suas posses nem por seu intelecto e principalmente pela cor que
carrega na pele.
A
casa era humilde. As pensões, na verdade cortiços eram muitos comuns naquela
época. Um misto de cidadanias invadira o local hoje conhecido como Lapa. Era
comum que nestes cortiços, bordéis se aglomerassem e meretrizes judias e
italianas se engalfiassem pela clientela, daí também as frequentes visitas das
Diligências o que hoje conhecemos como Polícia vinham apartar os arranca-rabos
e então surgiu outro termo de nossa língua mãe foi concebido. Tudo começou com
as prostitutas judias que vieram para o Brasil no final do século XIX e começo
do século XX, elas falavam iídiche, a língua dos judeus da Europa Central.
Quando achavam que um cliente tinha doença venérea, falavam ein krenke (krank
significa "doente" em alemão). Nascia assim a palavra
"encrenca”, porque os brasileiros da época entendiam que tal menção era
feita para avisar sobre a chegada das Diligências usada desde então no
português do Brasil para designar uma situação difícil.
A
senhora tinha um peso no olhar inconfundível. Dispensava qualquer apresentação.
Convidou-os
para entrar em seu quarto apertado e o se acomodaram. Judith rompeu o silêncio:
—Me
disseram que a senhorita viria. — ela era ruiva, ela muito alva e bem sardenta
e dedos comidos por unheiras de tanto lavar roupas para fora em troca de comida
e trocados para não se prostituir.
Reis
foi direto ao ponto:
—Como
espera que eu ajude sua a senhora?
A
mulher desabou a chorar. Bento emprestou gentilmente o lenço da lapela de seu
paletó. Minutos se passam a senhora se refaz.
—Anete
não vivia comigo. Vivia com a madrinha em seu bairro senhorita Hangra. Ela é
uma madama de posses e desde que minha menina desmamou foi entregue a ela de
comum acordo.
—Então
tinha acesso a sua filha?— rebateu a investigadora.
—Sim.
Sempre! Inclusive me chamava de mãezinha... — emocionando outra vez.
—E
que houve?— Rendeu-se Bento ao assunto.
—Tudo
que sei é que naquele dia minha Anete nesta posição ao qual foi pintada e em
seguida, ao voltar ao à sala jazia seu corpo inerte e sem seiva alguma. Um
facínora a assinou num golpe frio e cruel, degolando-a como uma ave para a
ceia!
—Acalme-se.
— Rogou Hangra. — E a mãe adotiva?
—Ela
é sobrinha da Baronesa de Campos. Seu nome é Francisca do Carmo.
—A
senhora do juiz Antunes do Carmo?— espantou-se Vicentin. Antunes era um dos
homens mais poderosos da Capital de São Sebastião do Rio de Janeiro.
—Aquieta-te
Bento!— impôs Reis. A preocupação era plausível, Antunes odiava Hangra Reis e
toda sua história e esta animosidade era declarada aos berros por pelo mesmo.
—Hangra,pelos
céus não se meta com este homem!— bradou Vicentin.
Ela
o desprezou e foi enfática em sua ordem a mulher:
—Apanhe
seus pertences, se quer realmente minha ajuda preciso que confie em mim e venha
comigo,mas saiba: Estando ao meu lado toda e qualquer guarida até então
oferecida por sua comadre e seu marido certamente lhe será cortada!
—Quero
um esclarecimento pela morte de Anete senhorita Hangra!— indo arrumar seus
pertences.
—Você
enlouqueceu? — balbuciou Bento.
—Acha
mesmo que vou passar um caso desses as claras?
—Deveria!
Hangra, vosmicê deve considerar isto, eu rogo!
—
Pense Bento,não se deixe levar pelas circunstâncias!
—Homessa!
Do que falas?
—Porque
será que sendo Francisca uma madrinha tão boa e deixando livre o acesso de
Judith a filha não a tirou deste pardieiro? Hã? Debaixo deste angu há caroços
Vicentin e eles não são torrões de açúcar. Dois mais dois ainda são quatro meu
caro!
A
volta para casa fora tranquila. Fica notório o quanto Judith encontrava—se em
estado de êxtase diante da elegante carruagem de Hangra e seu olhar inda mais
fulgente ao ver o tamanho de sua majestosa mansão no Catete.
Bento
foi o primeiro a descer e amparar as damas ao solo.
—Sua
casa é de fato um primor senhorita Reis! — proferiu a Judith. Hangra rebateu
com um tom especulativo:
—Não
tão diferente da casa de sua comadre a senhora Francisca do Carmo.
—Que
isso senhorita? Deverás mais refinada! Vê-se mesmo que és uma pessoa de posses
como falam.
Ao
adentrar Donana que era por costume desconfiada e de gênio difícil ao ver a
visita deixou os lábios em bico e pondo as mãos na cintura investigou:
—Quem
é essa aí?
—Uma
visita Donana. — respondeu Reis retirando as luvas e o chapéu e os acomodando
num aparador no hall de entrada. — Seu nome é Judith Braga.
—A
tal que jogou a carta e quase matou nós tudo é?
—Em
carne e osso. — Objetou Hangra deixando claro que sua implicância em nada
mudaria a situação. — Prepare um dos quartos de hóspedes Donana. A senhora
Judith ficará alguns dias conosco.
—
O defunto quando encontra quem carrega o caixão sempre se sacode... — pondo-se
a desatinar palavras confusas como de costume quando contrariada.
Após
acomodar a convidada Hangra Reis chamou Vicentin ao escritório para uma
conversa a portas fechadas:
—Então,
algum confábulo? — indagou Bento olhando seu relógio de bolso e o repousando no
paletó no bolso interno do lado esquerdo.
—Preciso
que vá ao cemitério e encontre o jazigo da menina. Quero saber o lote ou
quadra, número, tudo! — Vicentin suspirou fundo, conhecia a moça, alcançava que
certamente ela já deveria ter desenvolvido uma linha de raciocínio para aquele
caso que embora semelhasse simplicidade apesar de atroz tendo em vista como se
dera, certamente era um ninho de mafagos.
—Posso
saber o motivo?
—
Após entregar-me iremos até lá com Judith e de lá a Comarca da Cidade.
—Para?
—Pedirei
a exumação do corpo de Anete.
—Vosmicê
o quê? Enlouqueceste Hangra Reis? – Adentrar num caso dele já é em si um
sandice e não satisfeita quer pedir a exumação? De fato, queres barulhos, tocas
o sino da igreja oras!
—Bento,
o que ainda fazes a minha frente? Mexa-se! Tudo isto é para este dia. Marcha!
E
lá ia Vicentin, outro contrariado do dia. A questão era compreensível, naquele
tempo pedir tal procedimento já era considerado problemático e de uma criança
então um ato repugnante perante a Igreja, que considerava os pequeninos como
seres in—corruptos, ou seja, puros e violar seu túmulo era como profanar a
memória de um anjo. Essa era a parte religiosa da questão, ainda haveria o
conflito de interesses afinal tratava—se de mexer diretamente no vespeiro
conhecido como Juiz Antunes Do Carmo, um inimigo declarado de Hangra Reis sem
nenhuma explicação aparente.
A
porta rangeu e a figura imponente de Hangra rompeu o silêncio de Judith que
deslumbrava pela janela o jardim da casa da investigadora.
—Vossa
permissão Judith?
Num
súbito susto virou—se respondendo:
—Ora
veja senhorita Reis que careça pedir permissão para adentrar em vosso próprio
lar.
—Gostaria
que se arrumasse Judith, iremos ao Mausoléu de Anete, cri que seria um bom
momento para aliviar sua dor ou me equivoquei? — levantando um ar
investigativo.
—Mausoléu
senhorita? — a mulher espantou—se.
—Sim.
Algum problema? – pesquisou Hangra remexendo a maçaneta.
—Minha
Anete não foi enterrada no Mausoléu da Família Carmo. Meu anjo jaze num
sepulcro dos bastardos. – Que era uma ala do cemitério destinado aos filhos
provenientes de ralações fora do casamento mas que foram de algum modo ou
criados ou mantidos pelos pais, que costumavam passar como padrinhos.
Hangra
somente parou refletindo e em seguida falou—lhe:
—Apronte—se.
A carruagem já nos espera, nos encontraremos com Bento que lá já nos
Na
carta havia escrito.
Peço
a quem encontrar este pedido,havendo fé em mim que seja a Senhotita Hangra Reis
do Brasil, ache forças para com ele desvendar este que foi o último momento de
minha pequena Anete. Que se foi pelas mãos de um selvagem, que um talho forte
em sua garganta ceifou lhe a vida de minha pequenina. Não tenho recursos
senhorita Reis, mas soube que o senso de justiça lhe absorve, então rogo a sua clemência
e aceite esse caso e dê um pouco de paz ao meu inquieto coração de mãe.
Judith
Braga.
Rua
do alfineiros,Brejo Alto.
—Bento,
mande preparar a carruagem, vamos sair e visitar esta senhora.
Na
chegada ao cemitério Bento Vicentin ainda não havia abordado, então, as duas se
dirigiram ao sepulcro da menina uma vez que Judith sabia onde se localizava.
Hangra deixou com Joaquim, o cocheiro, a ordem de onde as encontra-la depois de
anotar o endereço que Judith deu prontamente.
Túmulo de Anete no Sepulcros dos Bastardos
De
fato o jazigo da menina, a pequena bailarina estava na parte mais afastada da
morada dos mortos. Um lugar esquecido pelos homens e seus passados
perturbadores. Judith emocionou-se ao vê-lo.
Hangra
abaixou repousando sobre a lápide botões de rosas brancas. Assim que Reis deu a
mãe um lenço para conter suas lágrimas, Vicentin chegou afoito e já indagando a
investigadora num canto.
_Por
que me mandou descobrir onde a menina tinha morrido se sabia que a mãe conhecia
o lugar?
Hangra
sorriu e fez sinal para que seu assistente a seguisse de volta a Judith.
_Judith,
desculpe mas a pergunta que não me cala precisa ser expurgada. - Hangra
referia-se ao fato da menina ter sido enterrada naquele local o que sugeria que
a paternidade de Anete fosse do então Juiz Antunes do Carmo.
A
mulher fechou o cenho, respirou fundo e principiou a falar desatinadamente:
_Senhorita
este é um segredo que jurei levar para além túmulo! – o que fez Valentin
compreender o intento de Hangra. Era óbvio que a mãe saberia onde a filha
estaria enterrada, assim como teria que expor o tal segredo se realmente fosse
o intento de fazer justiça e de cara já podia alcançar o pretexto pelo qual tão
bondosa madrinha nunca a impediu a visitação e certo contato com a criança,
entretanto nunca o tirou da sarjeta dos cortiços.- Me envolvi com Antunes na
vinda das Minas Gerais para cá senhorita. A senhorita deve conhecer os boatos a
respeito dele.
_Que
boatos? – averiguou Bento.
_O
Juiz Antunes do Carmo é também conhecido como o Senhorio dos Bokmanis - palavra
não localizada nos dicionários consultados; provavelmente trata-se de alguém
ligado ao comércio de escravos na Costa das Minas Gerais.
_Tráfico
de escravos? – ressaltou Vicentin.
_Mas
que trazes acima do pescoço, Homessa? –disparou Hangra Reis.- O que fases com
está cabeçorra que não prestas atenção alguma ao que está em vossa volta homem?
Antunes é Senhor Mor Bokmani fecha a bora pela sua posição de social e é fato
que possui um imenso Cabedal. – que eram grossos dízimos, foros ou pensões.
Judith
concluiu:
_Tenho
certeza que minha Anete foi assassinada a mando de um dos dois.
_Possivelmente-Adiantou-se
Bento com mãos na lapela.
O
que Hangra reprovou com um olhar. Dias se passaram e um alarido tomou a cidade,
pois sendo advogada, Hangra soube manejar as leis ao seu favor e evitar que
Antunes tivesse acesso ao seu pedido de exumação do corpo da filha como Juiz.
No dia da exumação, todos estavam presentes, Hangra Reis, Bento Vicentin,
Judith, a madrinha de Anete, o Padre a pedido da Madrinha e o Médico a pedido
da investigadora.
Quando
o corpo foi trago e colocado na sala cheia de barras de gelos para diminuir o
odor da putrefação, porque era dessa maneira que as coisas eram feitas.
O
médico ficou a posto esperando as perguntas de Hangra que era fulminada pelo
Juiz que chegou atrasado juntando-se a esposa que era consolada pelo padre.
_
Violar o descanso de uma criança! A senhorita teme a Deus? – Soltou o padre.
_Sim
padre. E como Ele gosto das coisas bem esclarecidas.
_Infame!–
disparou o Juiz, cuidarei que pague por isso Senhorita Hangra Reis do Brasil.
_Tem
algo a ser escondido caro Juiz Antunes? Refiro a este caso logicamente, pois
bem sei que tens e muito a ocultar dos olhos de nossa Nação, falo algo
inapropriado? – caminhando frente ao corpo da menina continuou:_ Ainda há algo
que preciso elucidar antes de avançarmos neste caso. Fui procurada pela senhora
Judith que se apresentou como mãe biológica de Anete, segundo a mesma, a garotinha
foi fruto de um caso entre ela e o nobre Juiz aqui presente, o que se confirmou
onde a pequena foi enterrada, nos Sepulcros dos Bastardos que dispensa de minha
parte explicações. Dito isto, nobre Doutor Sebastião, o ferimento que matou
Anete foi em qual direção?
O
homem examinou o corpo inocente e respondeu:
_Da
esquerda direita senhorita Reis.
_Perfeito.-
expôs Hangra.
_Com
que tipo de objeto?
_Provavelmente
lâmina muito fina, mas profunda.
_Interessante.-
objetou a moça outra vez. O senhor se atreveria dizer mais sobre tal objeto?
Faca? Punhal? Estilete?
_Nenhum
deles com certeza. Foi um elemento mais fino e pontiagudo.
_Entendo.-
obtemperou Reis andando de um lado a outro. _ Senhora Francisca Do
Carmo,naquele momento em que Anete parou para ser pintada saberia nos contar
para onde lançava seu olhar?
_Sim.
A frente dela estavam meu marido.
_Sozinho?
A
mulher o olhou sério e fez uma revelação capciosa:
_Pelo
que vi, do ângulo que me encontrava, havia alguém conversando com ele atrás da
cortina do lado esquerdo, mas não sei quem, não vi a pessoa.
_Só
mais uma coisa senhora...A credita que seu marido seria capaz de matar a filha
bastarda por alguma razão?
_Jamais.
Antunes é um homem de poucas palavras porém, sempre foi muito carinhoso com
Anete como eu também.
Foi
quando Judith se pronunciou:
_Vosmicê?
Faça me rir! Aturou minha Anete goela adentro como licor de bacalhau, em tempo
algum teve por ela, amor de mãe!
_Judith...Sempre
amei Anete como a filha que não pude ter.
_E
as escoriações que meu anjinho apresentava pelo corpo? Machas, hematomas? Como
paravam nela?
Hangra
interferiu.
_Como
eram essas lacerações senhora Judith?
_Digna
de pena. Todas! Não suporto se quer lembrar.
Hangra
olhou o corpo da menina e depois de analisa-lo pediu ao médico que o tapasse e
o levasse para um local privado do que seria revelado. A senhorita
posicionou-se no meio da sala e foi enfática:
_O
assassino de Anete encontra-se nessa sala senhores.
-
Foi quando o Diligência surgiu com alguns guardas para efetuar a prisão
previamente avisados por Reis.
_Como
pode ter tanta certeza? – Perguntou o padre.
_Dados,
dados, dados, não faço tijolos sem barros Padre. - gracejou sem perder a
seriedade que a questão exigia.
Todos
emudeceram afoitos.
_O
assassino de Anete foi muito perspicaz. Inclusive porque premeditou o crime,
uma vez que sabia que naquele dia o quadro da menina estava sendo pintado e
como qualquer criança,lançaria seus olhos encantados para pessoas que amava,
por isso lançou o olhar para o pai, o Juiz Antunes do Carmo.
_Como
ousa Hangra Reis? Acusar-me de matar minha filha?
_Só
pode ter sido vosmicê! Monstro! -berrou Judith.
_Antunes!!!!-Do
Carmo caiu nos braços do Padre foi quando o Chefe de Polícia volveu-se a ele
para prendê-lo e Hangra o impediu arguindo:
_Permita-me
terminar. - A jovem prosseguiu:_ Entretanto, isso não faz do Juiz o chacino da
pequena bailarina.
_Quem
então? Ela era bastarda. Como explicaria a filha bastarda sendo um juiz? Se não
foi ele, quem mais poderia cometer tamanho ato?– questionou Bento afoito como
todos os outros.
Hangra
deliberou:
_Sabe
há curiosidades muito pertinentes no corpo humano. Imaginem que uma pessoa que
é canhota, tem por hábito em reflexos ocultar-se sempre no lado esquerdo. Assim
também como toca e usa coisas no dia a dia, e segue ao agredir ou para
defender-se, o canhoto sempre sucede do mesmo modo, para direita. E o homicida
de Anete era esquerdo. Também era ambicioso, coisas suntuosas, belas, como
casas de alto de nível por exemplo. Naquele dia fatídico certamente seu
executor tentou remediar algo com Juiz Antunes, ele não aceitou o fato de ser
meramente excluído e decidiu romper com o silêncio que seria além-túmulo. -
Lançando o olhar para mãe que transformou o semblante de dor em surpresa e deixou
escapar num balbucio:
_Como
soube?
Hangra
parou rente a ela a enfrentou cara a cara:
_Percebi
que era canhota desde quando li sua carta jogada em minha casa senhora Judith,
mas aquela persistente inclinação para esquerda no topo dos tis, traços e assentos
são reveladores, o que confirmei quando fomos apresentadas. Como pegou a
xícara, como apoiou-se para adentrar na carruagem. Todavia, foi o seu deslumbre
pela minha residência que me observa-la mais de perto. De repente sua tristeza
de uma mãe justiceira diante dos mimos que o dinheiro pode nos dar confesso fez
mostrar o quanto sua cobiça era notória. Tudo em meu lar era tão lindo aos seus
olhos. Fulgente mesmo foi quando lhe emprestei o lenço diante da lápide de
Anete, mais uma vez a senhora o apanha com a mão esquerda e ao me devolver
percebo que jazia seco, perguntei-me para onde foram aquelas lágrimas tão
copiosas e absorvente a instantes de mim? A senhora Judith jamais amou Anete
fez dela um moeda de troca, que com o tempo viu que não seria tão simples
assim. Haja vista também que as escoriações que cometeu na menina eram na
intenção que o pai voltasse contra sua esposa por maltratar a filha e quem sabe
ter uma nova família com a costureira.Por isso naquele dia em que o quadro foi
pintado foi também a última que visitou o Juiz conversando com ele no lado
esquerdo da cortina para onde a filha olhou porque certamente a viu ou ouviu
sua voz. Anete não olhou para o pai, o que prendeu sua atenção foi a mãe.
_Mas
por quê vosmicê? - quis saber o Juiz.
_Ela
sabia do entrevero entre nós Juiz Antunes, supôs que faria de tudo para
incrimina-lo.No entanto, esqueceu que procura a justiça seja como ela for e não
cartas marcadas.
_Mas
como matou a menina?
_Um
corte producente da esquerda para direita, de uma lâmina fina, uma agulha.Que
mais um lavadeira e costureira pode ter em casa para cometer tal ato. Minto
Doutor?
_Não,
uma agulha seria completamente compatível com os machucados.
E
foi quando os guardas a prenderam e a levaram.
Na
saída Antunes veio ter com Hangra:
_Obrigado.De
fato Judith vinha tentando convencer-me algum tempo dos maus tratos que Anete
sofria,ela alegava a minha senhora,contudo via como Chica amava minha Anete.E
naquele dia foi mesmo ela quem conversava comigo as escondidas,mas nossa
bailarina viu.Numa das inúmeras ameaças que me fez,disse que muito me
arrependeria,no entanto em tempo algum cogitei tal desgraça,ela sempre
aparentou amar a criança.E depois se foi.
_Não
tem que me agradecer, fiz isso em memória de sua filha. Agora a pequena
bailarina poderá dançar nos céus dos anjos e em paz. No entanto, se quiser
realmente agradar-me Juiz, dê a sua filha o lugar que merece. Um funeral justo,
repouse seu corpo no Mausoléu de sua família porque é lá que Anete deve ficar.
Dias
depois O casal Carmo refez o funeral da menina. E ao sair do cemitério Hangra e
Bento que foram convidados de honra, trocavam palavras quando a moça
descontinuou os passos como quem vira algo.
Um
ar correu entre os dois,o ar ficou mais leve,um ruido como uma gostosa
gargalhada se perdeu.
_O
que foi Hangra? - investigou Vicentin que nada via onde ela repousava o olhar.
_Nada.
Só me emocionei por um instante.
_Por
quê?
_É
assim que me sinto toda vez que posso ver uma bailarina dançando - respondeu
abrandada pondo-se a conversar outra vez.
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