Quem sou eu?

Danka Maia é Escritora, Professora, mora no Rio de Janeiro e tem mais de vinte e cinco obras. Adora ler, e entende a escrita como a forma que o Destino lhe deu para se expressar. Ama sua família, amigos e animais. “Quando quero fugir escrevo, quando quero ser encontrada oro”.

HANGRA REIS & A MANSÃO BOUDELAIRE




 PREFÁCIO
O livro de contos de Hangra Reis oferece ao leitor inúmeras oportunidades de entrar em uma verdadeira máquina do tempo, mergulhando em um passado que ainda marca a História do Brasil: o início do século XX, com todas as mudanças trazidas pouco depois da Abolição da Escravatura e a Proclamação da República, um ano depois.
É exatamente no dia da Abolição, 13 de maio de 1888, que começa a jornada da nossa personagem principal, Hangra Reis do Brasil, nascida nesta data e filha de pais negros alforriados. Com a morte dos mesmos, é criada pelo Barão e pela Baronesa donos da Fazenda Progresso, onde nasceu. E para completo assombro de todos, algo inusitado acontece quando é adotada por eles e se torna sua única herdeira.
Sua história já começa surpreendente. Em meio a uma sociedade completamente racista, que se acostumou a tratar o negro como escravo, que via no branqueamento da população uma maneira de desenvolver o Brasil, como se seu atraso fosse a cor escura da pele, Hangra se torna ímpar. O que dizer de uma negra rica, bem educada e extremamente inteligente? Não bastasse isso, enfrenta também o preconceito de ser mulher em uma época que mulheres não estudam, não votam e são submissas ao marido.
Em meio a tudo isso, Hangra ainda encontra em seu caminho alguns mistérios e casos não resolvidos que chamam a sua atenção e passa a dedicar a eles seu tempo e sua dedicação, se tornando então uma investigadora mais do que diferente de todos os outros, decidida a provar que para cada suspense ou paranormalidade, existe uma explicação. Quem acredita nela? Um amigo e eterno apaixonado, que a ajuda a resolver os casos como fiel escudeiro. E uma senhora negra que acaba salvando e se torna sua companheira inseparável, cuidando de Hangra como uma verdadeira filha.
Mistérios marcam os diversos contos deste volume, que além de muito bem escritos pela autora Danka Maia, trazem a figura inquestionavelmente atraente e inteligente de Hangra Reis, retratam como era a época em que se passa a história, entre 1910 e 1920 no Rio de Janeiro, e mergulham o leitor em um desejo alucinado de acompanhar cada aventura e se surpreender no final.
Tem Hangra Reis para todos os gostos. Apaixone-se também por ela e vivencie seus dramas e também as ameaças e preconceitos que sofre, mas que não conseguem pará-la. Hangra Reis chegou para ficar e mudar a História dos suspenses policiais. Por ser única e prezar pela alta qualidade da escrita. Prepare-se para entrar nessa máquina do tempo.



BIOGRAFIA

Final do século XIX,no dia 13 de maio de 1888, em pleno dia  onde extingui-se a escravidão no Brasil.Uma menina, filha de escravos já alforriados consegue sobreviver a um parto extremamente difícil que acarreta na morte de sua mãe,Antônia. Os donos da Fazenda Progresso, o Barão Heleno de Bourbon primo em segundo grau da família da corte francesa, agraciado em bens e sua esposa a Baronesa Belina, que jamais conseguiram ter filhos, haja vista que os que nasceram foram natimortos. Sempre conhecidos por ser tão solícitos aos seus criados, porque foi um dos pioneiros a reconhecer o trabalho e pagar em moeda corrente pelos préstimos daquele povo africano. Decidiram para o assombro de toda comunidade Carioca da época adotar como filha menina que nascera naquele dia, chama-la de Hangra Reis do Brasil sobrenome que os pais adotaram quando aqui chegaram da África. Hangra Reis fora uma homenagem que a Baronesa desejou fazer ao vilarejo Angra dos Reis - Estado do Rio de Janeiro, que tanto amava e que para si o local que mais dignificava o solo sagrado brasileiro.
Hangra recebeu a melhor educação que o poder aquisitivo da época comportava, no entanto, muitas vezes esbarrou no mesmo contexto:O preconceito Racial.Era intolerável para a sociedade aristocrata da época aceitar um casal de senhores feudais ter como filha além de adotada também negra.Contudo, isso jamais impediu a menina que virou adolescente e então mulher, dominar seis idiomas, completar os estudos,  formar-se com  louvor  em direito inda que tivesse que assistir algumas aulas no fundo da sala com dois metros de distância da penúltima fileira por exigência dos demais pais e mestres e sendo a única mulher e negra dentro da sala.
  No entanto, em seu coração ela incansavelmente teve o mesmo ideal, investigar casos cujos não havia explicações ou era absurdamente abafados dadas as circunstâncias ora política ora  social-econômica dos indivíduos envolvidos.Seu pai era reticente quanto a isto, no fundo o Barão julgava que filha conseguiria uma vez sendo mulher e principalmente negra.Após a morte de  Belina, sua mãe,ele também logo sucumbiu deixando todos os bens para sua única herdeira, que vendeu a propriedade, e atirou-se a sua jornada crendo que essa era sua sina e paixão.

HANGRA REIS & A MANSÃO BOUDELAIRE



Meses haviam se passado desde então. Nenhuma notícia sobre Javanka tinha sido corrido. Hangra continuava agora em seu escritório com Bento Vicentin enfrentando o preconceito das pessoas do Velho Catete, que embora soubessem da repercussão de sua sagacidade e inteligência, não a poupavam de sempre a fitar como a "Negra Insolente". Nenhuma alma entrava no escritório, mas isso não desanimava, ela passava os dias lendo jornais, pesquisando ,lendo, pronta para qual fosse a sua próxima missão. Bento, por mais que admirasse a garra da jovem, não deixava de ajuizar lá com seus botões se não fosse melhor largar tudo aquilo. Afinal, Hangra não carecia daquela situação para viver, tinha posses, podia ir em frente sem necessitar de toda aquela exposição. E decidiu se manifestara respeito:

— Tenho pensado sobre este escritório e você. - iniciou Bento interrompendo os estudos da moça que semelhava estar em outra atmosfera.
—E o onde foi que esse tal pensamento o levou meu caro novato?- colocando os punhos sobre a quina da mesa e se recostando na cadeira que fora de seu pai trazida da fazenda.

—Hangra... Isto é desnecessário. -sendo firme. - Não precisa disto. E além do mais, ficar se expondo para esse povo, uma sociedade tão hipócrita quanto preconceituosa.

—Acha que devo desistir do escritório- A jovem foi ao centro da questão sem rodeios. -Permita-me narrar uma fábula que meu pai me contava quando criança na fazenda. Havia um caixeiro viajante que continuamente passava pelo mesmo vilarejo há anos via um homem no meio da praça que falava e falava sobre como abrir os olhos daquele povo, no entanto aquelas pessoas simplesmente o ignoravam de tal modo como se ele jamais estivera ali. Em sua última viagem pela cidade,o caixeiro resolveu perguntar aquele sujeito:
—Eu passo por aqui há anos e sempre o vi aqui falando e falando para esse povo que jamais lhe deu a menor atenção. Por que insisti tanto nisto?
O individuo sorriu, parou de falar, desceu do caixote e contrapôs:
—A resposta é bem simples meu senhor. Porque se eu desistir, serão eles quem terá me mudado. -E voltou a bradar ao povo.
Bento sorriu após o término esboçando o voto vencido.
—Preciso elucidar mais novato? - Hangra indagou torcendo um pouco o pescoço para esquerda.

—Não. Compreendi.
Foi neste instante que um senhor alto, bem apessoado que despertou um terno sorriso de lábios de Hangra que correu para abraça-lo saudando-o:
—Tio Tóvinho! - Tratava-se do Doutor de Cristóvão Dutra Rezende, advogado renomado que a conheceu desde sucessivamente. Ele sempre a incentivou demasiadamente e foi uma espécie de pai postiço na falta de seu pai ininterruptamente a estimulando a prosseguir seus estudos e seu lugar na sociedade. Fazia anos que não se viam.
 Depois que a saudade foi morta momentaneamente, ela o reapresentou Bento e depois de quase meia hora de conversa o Doutor Cristóvão disse o que levou procura-la.
— Bem minha amada flor morena- como carinhosamente a intitulava. — a razão que me fez vir ao seu encontro foi um caso que tenho nas mãos, mas por encargos e jogo de interesses, amizades mais propriamente ditas não sou a pessoa indicada para cuidar do caso.
— E do que se trata tio?- a jovem sentou-se a espera a resposta depois servi-lo com uma xícara de chá de laranjeira.
— Bem, é a Mansão Baudelaire. A propriedade pertence à linhagem existe pelo menos três gerações, mais especificadamente desde 1752. No entanto de aproximadamente cinquenta anos uma antiga maldição, crendices em minha opinião. — riu sacudindo a mão esquerda.  — Todos os doze herdeiros dentro da linhagem infelizmente morreram sobre circunstâncias um tanto soturnas.
—Como? —ela o inquiriu.
—Enforcados.
—Pelos céus senhor Cristóvão!- bradou Bento. — E o senhor acha isto norma?-replicou.
—Enfim, cada um que tinha o direito de receber veio a óbito pelo mesma razão. E a tal maldição que jazia há anos no seio da família tomou uma proporção deverás gigantesca.
—Maldição? — Hangra ficou como por enfeitiçada.
—Palavra mágica para os ouvidos dela! — gracejou Bento erguendo com as mãos para trás indo até a porta.
—Não lhe dê ouvido tio, fale-me da maldição.
—Filha... — pediu atenção com as mãos, ele era um sujeito que gesticulava muito. — A maldição é secundária na situação. A questão é que meu cliente, o senhor Gastón Baudelaire é um grande amigo, e isto me impede de administrar. O desejo de Gastón é que a propriedade seja vendida o quanto antes, e ele não quer correr o risco de ter o anexo pescoço da na forca desta vez.

— E ele é o último na linhagem para herdar a mansão? — quis averiguar a jovem.
— Sim,Gastón não teve filhos. Casou-se por duas vezes, mas todos seus filhos nasceram natimortos, assim como ficou viúvo pelas mesmas duas vezes um grande infortúnio em sua vida.
—Pobre homem. — disse Hangra.
—Você poderia assumir os documentos para a venda da Mansão Hangra?
—Pois Claro que sim meu tio. Agora mesmo se desejar.
—Podíamos ir até agora. O que acha?
—Por mim, perfeito! — levantando-se pronta para o caso.
Bento consentiu com a cabeça.
No trajeto para a mansão, quase três horas de carruagem já que ficava na zona rural. Fora um momento de recordações, tempos bons que não voltariam mais. Porque o tempo é senhor em não dar segundas chances a oportunidades esquecidas.
Logo que puderam avistar a propriedade estaca claro. Era de fato um lugar imponente, nebuloso mais belíssimo.
—Que brisa é essa tio? — questionou a jovem.
—Faz parte da dita maldição segundo os Baudelaire. Mas cá entre nós, creio mesmo em puro orvalho, afinal estamos num pé de serra. — sorrindo.
— Com certeza. — respaldou Bento.
Hangra parou por um segundo e prosseguiu a conversa ao cume que desejava.
— E como se deu a maldição?
O moço olhou Vicentin meu arredio em tocar no assunto, mas os olhos fulgentes de Hangra tornava sua fuga praticamente inconcebível.
—Bem. A casa foi construída como parte de um acordo de cavalheiros feito entre o Duque Cousteau e o Visconde Lemom Baudelaire. Onde o filho da família Cousteau ,Mourice deveria se casar com sua única filha,Katarina. A mansão seria presente de casamento e parte do dote ofertado pelo pai da noiva que segundo contam não era a beleza em pessoa.
Os dois homens sorriram. Hangra os corrigiu:
—A eterna exigência masculina. Além de ser mulher, tem que ser bela. Imagine se indagassem a nós, as mulheres.

— O que diriam? — quis saber Bento gracejando.
—Certamente que além de homens tivessem cérebros. Para que duas cabeças se nenhuma delas pensa. — O que causou imenso desconforto aos dois. Cristóvão intuiu que fosse uma boa hora para continuar as explicações da maldição da linha Baudelaire.
— Mourice tinha um caso em secreto com uma escrava de sua casa. E o sentimento de tão forte o levou a pensar em abandonar tudo e seguir com ela.Por intermédio direto da família, a escrava foi posta a venda, mas Mourice a conseguiu ajudar fugir.Depois teve que se casar com Katarina. Porém, seu pai caçou a escrava por todo canto e ela foi capturada a laço dentro da mata fechada. Levou cerva de quarenta chibatadas, e após de ser tratada com salmoura de sal grosso e vinagre, foi enforcada.Antes de morrer ela amaldiçoou Mourice e a esposa, que dariam seguimento a linhagem Baudelaire com a seguinte citação:
" TODO HOMEM QUE POSSUIR A BOUDELAIRE COM O PESCOÇO COMO O MEU ESTARÁ."
— Entretanto, essa maldição ganhou força mesmo de cinquenta anos para cá,como comentei anteriormente.
Hangra arqueou as famosas sobrancelhas e os singulares olhos verdes herdados de sua genealogia e que faziam parte dela dando um toque todo peculiar a sua formosura expressando:
— Fato capcioso.
 Na entrada jazia ansioso com mais dois criados, o então angustiado herdeiro o senhor Gastón Baudelaire. Era um senhor na casa de seus setenta anos, barba espessa, face gentil, bem alinhado,parecia na verdade um legitimo Lorde inglês, apesar do sobre nome francês.
— Sois muito bem-vindo a propriedade Dos Baudelaire! — Saudou com os braços abertos esquecendo a frieza dos franceses.
Todos desceram da carruagem. Hangra foi à última amparada pela mão de Bento, e apesar o chão e tratou de analisar cada detalhe. A mansão misturava-se entre predicados Elisabetanos e o requinte dos mosaicos franceses do século XVII para o XVIII, mas não podia se negar quer a simplesmente um lugar magnífico. Esplêndido seria a palavra apropriada.
Após a primeira impressão Cristóvão apresentou Hangra ao Senhor Gastón que lhe beijou a mão, atitude que chamou atenção da jovem advogada. Ele não se incomodara com pormenor dela ser mulher e negra que trataria da tal papelada.
— Realmente seu tio não mentiu quando a descreveu para mim senhorita Hangra Reis. Tens uma beleza e presença única. — O que deixou Bento levemente enciumado, Hangra somente agradeceu e todos entraram na tal morada amaldiçoada.

 O interior era mais rico em minudencias. Lareira de mármore, móveis esculpido em madeira de carvalho, um ostentação para aquela época. E um marcante predicado na parede que possuía a escadaria que levava para o segundo piso do ambiente. Quadros pintados a óleo de todos os ancestrais da linhagem Baudelaire. Sem dúvidas, mais uma evidencia do poder econômico e social que aquele clã detinha.
—É com certeza uma família bem grande, senhor Gastón. 
— Evidenciou Bento com as mãos para trás. Hangra sentou-se no sofá proeminente observando o recinto. Uma criada logo surgiu para servir chá com biscoitos de araruta. Depois de um abreviado instante de prosa a jovem pediu a palavra.
—Senhor Baudelaire, pelo que percebi falta um retrato na parede de quadros de sua árvore genealógica.
O consorte sorriu chacoalhando o dedo indicador:
—Muito astuta senhorita Hangra, muito astuta.
Todos sorriram pela forma como o homem gracejou a fala.
—É pela tradição da minha família o quadro dos membros só podem estar ali após sua morte.
—Então devo supor que a pintura que falta é a sua. — ponderou a jovem.
— Sim. — admitiu Gastón. Como não tive filhos,sou o último da linhagem Baudelaire e não pretendo morrer tão cedo, e em virtude disto é que procurei por meu velho amigo Cristóvão e decidi vender a mansão Baudelaire.
—Mais uma propriedade como está? — indagou Bento após uma talagada de chá. —Quantos acres?
— Seiscentos acres. — O que fez o jovem quase engasgar-se.
—Seiscentos?
—Em nenhum tempo considerou refletir sobre tal decisão senhor Gastón? — averiguou Hangra.
—Minha querida, com essa maldição sobre meu sangue, não mesmo.
—Bem lembrado, o senhor poderia detalhar-me quando precisamente essa maldição ganhou força?
—Hangra... — resmungou Cristóvão.

— Deixe-a Cristóvão. Entendo sua curiosidade senhorita Reis, mas prefiro não entrar nos predicados macabros. No entanto, separei minha biblioteca e pedi aos meus criados que colocassem todos os documentos da conveniência, tudo está lá ao seu dispor. Peço urgência, realmente temo e muito pela minha vida. — sendo incisivamente firme.
—Pois então tenho sua permissão para que eu e meu assistente Bento Vicentin possamos iniciarmos? — investigou outra vez.
—Por favor, fiquem a vontade. A mansão Baudelaire está em suas mãos. — erguendo-se. — Se não se importam meu cocheiro me aguarda, careço estar para cesta com uma amiga distante que vem me visitar.
Hangra estranhou a colocação.
—O senhor não vive aqui?
—De maneira alguma minha cara!-Protestou Gastón. - Jamais vive na Mansão Baudelaire. Este lugar me dar calafrios, e agora mais que nunca, quero passar o mínimo de tempo possível aqui. —  ajeitando o paletó e impondo o peso sobre a inseparável bengala.
A jovem acenou a cabeça e lançou um olhar para Bento que a acompanhou após despedir-se de Gastón e de Cristóvão. O senhor Baudelaire permitira a estadia de Hangra Reis e seu fiel escudeiro, Bento para o tempo mandatório para que preparassem toda a papelada para venda da suntuosa residência.
Enquanto Vicentin descobria onde jaziam seus aposentos e o de Hangra, a moça embrenhou-se na biblioteca que lhe chamou atenção pela beleza dos delineies e quantidade de livros raros.
 Ali se encontravam obras de Thaikosvky,Maquiavel,Dostoiévski,Shakespeare e estimadas e prodigiosas enciclopédias de vários outros renomados escritores, sem dúvida um patrimônio a ser muito bem estimado e considerado a se desfazer por uma pessoa. De súbito fez com que Hangra refletisse sobre a tensão e força que a tal maldição exercia sobre o senhoril Gastón Baudelaire.
Ao adentrar o recinto Bento espantou-se também.
—Homessa! Por acaso morri e meu espírito jaz no paraíso? — Porque como Hangra amava ler.
 A moça sentou-se na grande mesa de madeira, relíquia feita de pau-brasil, com detalhes de anjos que começavam nos pés do móvel como se estivessem segurando o peso da tampa lisa avermelhadas da madeira dita.
—Santo Deus! Olhe esta mesa, Hangra? — passando as mãos enquanto a senhorita Reis suspirava já remexendo algumas pastas que ali estavam.

—Pelo visto não teremos muito a fazer.  —  Disse a moça um tanto enfadada.
—Como não? — argumentou Vicentin.
—Pelo que estou vendo, a papelada da Mansão está perfeitamente em dia e mais que amoldada para efetivação da venda da mesma. E ser quer saber mesmo, o que me fez aceitar o caso foi a tal...
—Maldição. — Bento concluiu porque a conhecia perfeitamente bem para compreender que este teria sido o estopim que impulsionara a jovem investigadora.
—Dois mais dois ainda são quatro, não é meu caro Novato? — gracejou contente por compreendê-la.
—Você quando coloca caraminholas na cabeça, pelos Céus! — sentando-se derrotado.
—Vamos laborar Novato, laborar! — E os dois começaram a separar papéis e mais papéis. Ao findar a tarde com toda documentação organizada Bento rebateu satisfeito:
—Serviço concluído e com louvor!
Hangra não escondia certo desdém pelo enfado de ver diante dela uma simples questão familiar. Cainhando pela longa biblioteca achou curioso que no meio de tanta madeira, em cima da velha lareira jazia uma obra de cristal, que lembrava uma Fênix. Aproximou-se e no afoito de tão logo no objeto tocar tropeçou na ponta do tapete persa e para evitar a queda suas mãos caíram com força sobre a lareira e colidindo contra a peça que ao invés de cair, tombou para trás dando o inicio de uma grande surpresa.
—Mais o que é isso? — perguntou Bento que não sabia se acudia Hangra a recompor-se ou se contemplava o que estava diante deles.
—Uma passagem secreta, não está vendo meu caro. — Os olhos verdes da jovem negra brilharam como de frente do sol. 
Bento retrocedeu passos.
—Ignoremos isto. Nosso trabalho já está quase completo Hangra. — rogou.
Ela o lançou um olhar e o advertiu:
—Crê que isto se resume a mera coincidência, homem? — mostrando com uma das mãos a passagem secreta que agora deixava o oculto e se abria diante deles.
—Hangra, pelo amor de Deus, se isto existe é porque esconde segredos do clã Baudelaire. Sejamos sensatos, não é do nosso bedelho! — repousando as mãos sobre a cintura amargurada.
Ela volveu alguns passos além dele, não para obedecê-lo, na verdade para apanhar o candelabro uma vez que a noite já despontava e com a luz poder adentrar ao recinto misterioso.
Contudo, a finalidade de Vicentin sempre foi à mesma, proteger Hangra dos perigos de si mesma e de sua mente tão díspar e prodigiosa. O ambiente além de escuro tinha um odor muito pouco convidativo e logo revirou o estomago do moço e fez a jovem dar a resposta do que se tratava.
—Que catinga é essa? Santo Deus! — bradou Bento se encostando-se à escada que levava para um patamar inferior.
—Putrefação, meu caro. Putrefação. — E inda que fosse de porte acanhado ela elevava o máximo possível o candeeiro para alumiar o caminho e aguentar os resmungos do parceiro.
—Putrefação? Não acredito que está nos submetendo a isto!
—Se aquiete Novato. O silêncio aqui também vale ouro. — imperou.
 Era mais de cem degraus, uma escadaria rente a parede que era tão escura e incompreensível deixando Hangra cada vez mais salivante. Bento não suportou o odor e chegou as vias de fato o que fez a jovem ressaltar.
—Homens. Seres superiores, sei! —  ironizando a questão.
Lá embaixo jaziam mausoléus avelhantados. Os dois se entreolharam abismados porque todos sem exceções encontravam-se abertos, expostos ao tempo, esquecimento e desdém.
— Julgo isto no mínimo profano. — segredou Bento no ombro da jovem.
—Pois para mim, profano seria não investigar!-Em alto e bom som. Logo se direcionando para uma das covas com esqueleto vestido com traje a rigor dentro do ataúde.
Bento foi tomado pelo estarrecimento.
—Você não vai...
Pois sim, Hangra sorriu e desceu dentro da cova, e notando que o pescoço do defunto jazia separado do restante do corpo, pegou o crânio com respeito e delicadeza.
—Meus olhos não contemplam isto! — bradou Bento desesperado.
Ignorando o assombro de Vicentin, Hangra cheirou a cabeça por três vezes completamente concentrada.
—Na frança te mandariam para a fogueira e eu como cúmplice. Bruxaria! — ele estava horrorizado com a performance de Reis que colocou o crânio de volta com muito zelo e objetou:
—Está aqui há mais de cinco anos com certeza. — limpando as luvas em seguida e com o pensamento longe como quem arquitetara adágios inaceitáveis para Vicentin que reagiu rebatendo:

—E como pode ter tanta certeza, viraste coveiro agora também?
—Para de falar asnices, Novato! Nunca para e observa os acontecimentos ao seu redor. O mundo reage a sua volta e você fica sempre preso, atravancado neste seu mundinho de concepções. Entenda homem,o mundo muda o tempo todo! — sacudindo a mão esquerda para que ele a ajudasse a sair da catacumba. — Quando ossos humanos passam ter cheiro da terra, é um indicio que já estão ali por mais de cinco anos.
Permaneceram ali ainda por quase vinte minutos, o que fez a jovem recuar fora o cheiro insuportável de apodrecimento de alguns cadáveres. E antes que Bento colocasse os rins para fora, julgou sensato volver a biblioteca.
—Isto fica cada vez mais interessante. —  confessou a moça de volta ao recinto dos livros.
—Pois desejo é um bom banho, este mau-cheiro se entranhou em minhas vestes como cicatrizes.
 Aquela noite em seu aposento Hangra fora invadida por aquela trama. As perguntas borbulhavam em sua mente a levando ao êxtase das especulações. Inda que o corpo pedisse arrego, relutava em dar-se aos braços de Morfeu, foi quando batidas conhecidas soaram da porta de seu aposento. Ajeitou-se me seu penhoar dourado, e abriu a porta com um candelabro já proferindo entre murmúrios:
—Entre logo Novato!
—Desculpe Hangra. — Adentrou em passos céleres e curtos. — Eu sei que não fica bem um cavalheiro vir a alcova de uma senhorita mas...
—Que cavalheiro? Onde está a dama? Você para mim é como um irmão. Quantas vezes tenho que repetir isto. É exaustivo sabia? — fechando a porta sem poder ouvir o Bento retrucara em sussurros:
—Pelo menos mais uma vez para que eu me convença e perca todas as esperanças a seu respeito.
—O que foi que aconteceu?- indagou com pouca paciência, a presença de Bento deixava Hangra com dificuldades de raciocínio,embora nunca despertasse nela a razão de tal proeza.
Ele retirou do bolso algo e a entregou na penumbra.
—Enquanto descia aquela catacumba, vi este objeto no chão e achei que deveria guardar para mostra-la mais tarde. — explicou indo para a janela.
Hangra pegou o pedaço de pano e dirigiu-se a pequena mesa no centro do cômodo, abriu o lenço branco e pôs o candeeiro para que iluminasse melhor. Tratava-se de um pequeno saco de erva secas e semelhavam passadas. Hangra arqueou o corpo e as sobrancelhas arguindo:
—Zabumba?
—Hã? — o moço resmungou.
—Zabumba. Também conhecida como erva-do-diabo e dos feiticeiros. Tem um vasto e poderoso poder em alucinações visuais e delírios incontroláveis.
 —O coração de uma mulher é como um oceano guarda muitos segredos. Se alguém ainda não disse essa frase, creia, um dia falará. — gracejou.
Minutos depois Bento Hangra decidiram que naquela manhã, assim que o sol desse o ar de sua graça abençoando mais um dia, pegariam a documentação da Mansão Baudelaire e seguiriam para a Capital ,para ele para entregar os papéis ao seu legítimo dono, Gastón Baudelaire, para ela investigar os últimos episódios começando pela pessoa mais confiável para confirmar suas suspeitas. Vicentin notou que os pensamentos eram contraditórios neste preciso instante:
—Cocheiro, sigamos para Rua Das Nações...
—Não, não! —replicou Hangra. — Rua do Príncipe, 1928.
—O que? — Bento espantou-se, momento certo para a moça descontrair a tensão de sua face.
—Ora Novato, andas esquecendo o endereço da tua própria casa? Seria a idade dando seus sinais?
—Homessa, que faremos em casa Hangra?
—Saberá, saberá meu caro Novato. — lançando o olhar ao longe enquanto o cocheiro mudava o trajeto.
Ao chegar a sua casa, Hangra correu gritando pelo recinto. 
—Donana! Donana!
Que surgiu roçando as anáguas pelo chão e estranhando a pressa da jovem:
—Mas que alarido é esse, sinhazinha?
Hangra lhe explicou tudo e por fim deu a consorte a tal erva que só em ver volveu passos vertiginosos.
—Erva de mandinga! — com o pavor nos olhos. — Onde foi que vosmicê arrumou isso?
—Pois não acabei de elucida-la,Donana. — com um tom suave.

—A sinhazinha devia ter deixado isto onde achou
—Donana, saberia explicar porque tal erva estaria num espécie de cemitério? — perguntou Bento.
—Sei responder não senhorzinho. Agora, só por estar lá, já não é um bom agouro. E que povo é esse que tem tumulo dentro de casa? Nos "quinta" é inté respeito com "senhô" da casa, mas num porão? — Donana dera a Hangra a informação que ela queria para ir adiante.
Beijou-a na testa, agarrou novato pelo braço e desatinaram pelas ruas do bairro até a Biblioteca da dos Jesuítas. A moça pouco se importava com os cochichos de sempre e seu foco nunca fora tão certo. Ao chegar na Biblioteca mais uma vez o preconceito racial resvalava nos caminhos de Hangra. Não permitiam a entrada de negros, inda que alforriados, limpos ou educados e ricos como era seu caso.
Entretanto, ela só precisou do que ininterruptamente fez, se impor com honra e queixo erguido. Mostrou sua carteira como advogada, jogou os papéis que comprovavam os títulos de nobrezas de seus pais adotivos em cima do balcão e foi enfática:
—Ainda ouvirei um não?
O balconista teve que se curvar diante dos atestados. Causou abafos por toda sociedade. Hangra Reis do Brasil , a primeira negra a adentrar na biblioteca da cidade. Mais uma vez ela fazia historia.
Pisou nos degraus da escadaria que dava acesso ao vão inferior onde ficavam as plantas das casas dos abastados na época e simplesmente desprezou qualquer olhar imponente em sua direção.
Lá foi sucinta com Bento:
—Não temos muito tempo, procure!
—Se me disseres o que? — um tanto arreliado.
—Procuramos pela planta da casa dos Baudelaire, que, diga-se de passagem, não se encontrava na documentação que preparamos a venda da propriedade, predicado capcioso julgo agora depois do que descobrimos. Santa barra do meu vestido!-batendo as mãos para o parceiro. — Mexa-se homem!
Foram horas até que ela mesma gritou esquecendo onde estava, por sorte sozinhos e sem ninguém para reclamar do tom altivo de sua voz.
Examinou cada detalhe da planta e fitando Vicentin perguntou:
—O que vê?

Ajeitando o chapéu tentou fazer firulas de um bom detetive, mas por fim resumiu-se:
—Cômodos?
Hangra sorriu batendo no ombro dele e o beijando no rosto como um hábito que tinha.
—Aprenda Bento,as vezes aquilo que não ficou evidente ou salta aos nossos olhos é onde estão as grandes pistas.
—Uma planta de uma casa com cômodos, onde está o que salta aos olhos Hangra? —replicou o jovem absorvido por sua ineficiência.
—Onde está o enorme vão do porão que guarda as catacumbas, Novato?
Subitamente Bento lançou o olhar outra vez para o documento aberto e constatou que ela estava certa.
—Por Santa Clara! Não é que tens razão? — coçando o rosto.
Vamos, precisamos falar com meu tio Cristóvão e o senhor Gastón Baudelaire. Talvez ele posso acrescentar algo a tudo isto, ou se espantar quando souber o que há debaixo da suntuosa mansão Baudelaire. Talvez ele possa acrescentar algo a tudo isto, ou se espantar quando souber o que há debaixo da suntuosa mansão Baudelaire. Despencaram atrás de Cristóvão e por sequencia chegariam a Gastón, mas o primeiro tentou frear a mocinha.
—Hangra... Não foi para isto que te a chamei a este caso. — discorreu num tom preocupado.
—Meu tio? — Ela tentou justificar-se embasada nas provas que juntara.
—Os Baudelaire são uma família de muitos segredos, muitos mistérios, coisas que Gastón não deseja remexer por isso me procurou para indicar alguém de minha interia confiança para resolver tão somente a venda da propriedade.  — explicou o senhor passando a mão pela testa levando Hangra a outro pensamento.
—Então o senhor sabia da cripta?
—Sim e não.  — ponderou sentando-se. — Aquele lugar foi construído inda pelo primeiro dono,foi uma exigência de Mourice. Era um local para encontrar-se com sua amante as escondidas. Ele não intuiu jamais que a caçariam e a matariam de modo tão primitivo e selvagem.
—Um quarto secreto? — estranhou Bento.
—Sim, pelo menos o que Gastón me elucidou, no entanto, ele não sabe dessas tais sepulcros. Diversas vezes, em inúmeras conversas mostrava-se arrepiar só de falar na tal cripta, para eles, o espírito inconformado da escrava. — benzendo-se em seguida.

—Tenho conversar com ele meu tio! —Hangra foi talhante na postura para desespero de Cristóvão.
—Homessa Hangra,nem por Chongas! Eu a proíbo!
—E eu com todo respeito que lhe tenho, desobedeço! — rebateu com uma força que o intimidou.
O que se deu foi à conturbada conversa entre Hangra Reis,Cristóvão, Gastón Baudelaire e a revelação que pareceu cair feito bomba sobre a cabeça do herdeiro.
Hangra observou todos sem exceções. Para ela estava claro que naqueles vinte e seis sepulcros jaziam os últimos cinquenta herdeiros vítimas da tal maldição. Ela voltara lá sem Bento e inspecionara,em cada cova dois corpo, na última nada, um agente para despistar. A questão para ela foi compreender o mistério que se ocultava ali. No dia que deveria entregar a documentação para os agora proprietários da mansão.
Hangra chegou acompanhada do Delgado e dois policiais com um mandado de prisão. Mais uma vez ela causara alvoroço.
—Mais o que significa isto Hangra?- perguntou Cristóvão estarrecido pela cena.
—Trago um mandado de prisão para o Senhor Gastón Baudelaire. —Todos se entreolharam sobressaltados.  — E explico! — completou. — O Senhor Gastón está sendo indiciado pelo homicídio DOLOSO de seus últimos parentes na sua linhagem.
—O que? — berrou Cristóvão
Gastón tentou correr e logo foi detido pelos policiais.
—Permita-me meu tio. — pediu Hangra com louvor. —Descobri uma passagem secreta na Mansão Baudelaire e sua maldição.E sim a maldição foi lançada pela escrava, mas jamais foi concretizada.A cripta foi feita com intuito de que os amantes Mourice a escrava ali pudessem se encontrar mas após a morte da mesma foi dado como destruída pelo clã. Nos últimos cinquenta anos, Gastón levado pela ambição executou friamente cada um dos herdeiros até que chegasse até ele.
—Mas todos foram mortos como reza a maldição? — disparou um dos presentes.
—Não, não foi. Após examinar cada um dos cadáveres...
—Você exumou os defuntos? — perguntou um senhor boquiaberto. Hangra prosseguiu:
—Após examinar, haja vista ter encontrado esta planta no recinto- mostrando a erva zambumba. — Conhecida entre os feiticeiros por seu grande poder em alucinações visuais e delírios incontroláveis, entretanto,esta erva também e conhecida pelos botânicos pelo seu vasto poder em sufocamento, basta espalma-la e em contato com a vitima é morte por sufocamento de certo.Os corpo tinham marcas de estrangulamentos ,porém nem todos.Tenho plena certeza de que em todos foram usado a mesma substância.

—E por que Gastón faria abissal barbárie? — Cristóvão não conseguia crer no que Hangra dizia enquanto o amigo recuava a cabeça para chão.
—Nas terras da propriedade não há somente acres e mais acres de terra, mas também algo bem mais valioso e reluzente. Uma jazida de ouro descoberto por um dos escravos da casa e a este restou a vigésima sexta cova, único jazigo que não tinha um Baudelaire na cripta secreta.
—Então por que razão Gastón a venderia? — quis saber o Delegado.
—Levantei a vida nos últimos anos do senhor Baudelaire.Sua dívida com jogatinas jazem na casa dos milhares. A venda da casa saldaria a dívida, no entanto, ele teria recursos suficientes para sobreviver e bem graças à mina de ouro.
—Negra Insolente! Você só tinha que preparar a papelada, nada mais! — bradou Gastón possesso sendo seguro pelos policiais e conduzido para a Delegacia onde assumiu a culpa dos crimes que adveio sobre sua família.
Dias depois, Cristóvão veio procurar Hangra e se desculpar por ter duvidado da capacidade elucidativa dela.
—Tudo ficou bem. — falou Bento vendo a carruagem de Cristóvão partir.
Hangra sorriu e rebateu gracejando:
—Espero que não seja por muito tempo.

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