Solilóquio de uma gata desiludida
Por Shirley Couto.
Há muito não paro para dialogar. Não tenho mais paciência com as pessoas hipócritas desse mundo, e muito menos com meus amigos bichanos. Os seres humanos sempre me decepcionam e fazem com que nada faça sentido quando o assunto é o amor. Muitos dizem amar mas se esquecem que o amor não é cruel e muito menos aprisiona ou amarra a pessoa em situações vexatórias.
Nós, anjos de quatro patas, amamos diferentemente. Amamos com o coração. Muitas vezes deparei-me com situações inusitadas de alguns seres humanos. Imagine: eu, uma gata tão racional e que preza pela liberdade, estar por algum instante cercada por grades invisíveis de um sentimento incompreendido pelos seres humanos! Já tentaram fazer isso comigo e o resultado foi assustador. Senti-me triste, incompreendida e incapaz. Em pouco tempo desvencilhei-me de tal sentimento. Isso não é amor! Não consigo imaginar nem apreender tal sentimento ligado a outros sentimentos que não sejam de tamanha magnitude ou pelo menos de sensações libertadoras que tragam alegria ao meu ser e ao meu coração felino, sempre apaixonado.
Amo! Amo, como uma gata apaixonada que mira seu alvo desejado com olhos de admiração e de devoção, com intuito de tê-lo sempre ao seu lado da forma mais singular possível. Amo de tal forma que o ser amado torna-se algo encantado e tão especial que apenas quem consegue amar dessa maneira entenderá a força desse amor febril. Tanto sentimento só é possível, pois ignoro a podridão desse mundinho hipócrita e faço de meus dias um momento único e só meu. Nesses dias, solitários e frios, a busca por um sentimento verdadeiro pulsa em meu ser como a batida de um coração sedento por tranquilidade, amor e honestidade.
A desilusão vem quando observo que o alvo pretendido não ostenta tal sentimento e que muitas vezes usa a máscara da incerteza para encobrir a realidade. Essa máscara é tão perversa que engana o ser apaixonado de tal forma que ele se enreda em teias de ilusões e mentiras que apenas o tempo poderá ajudá-lo a se livrar. Essa parte me assusta! Como lutar com um inimigo invisível e tão avassalador? Como fugir de tanta hipocrisia? Como amar num mundo assim? Pois é, ficam essas questões que me faço constantemente e, com elas, uma dúvida final: o que posso fazer para amar e fugir da desilusão de um sentimento inexistente? Como dar minhas miadas apaixonadas sem ao menos preocupar-me com a dor da desilusão? Como?
Miadas desiludidas!
VAI BRASIL!
Formada em Letras pela Unicamp, com pós-graduação em Língua Portuguesa, Shirley Couto é professora de Português do colégio Sérgio Buarque de Holanda, na Zona Sul de São Paulo. Realiza trabalho de leitura e redação com alunos das séries finais do Ensino Fundamental e escreve a coluna Gatices e outros bichos para o blog da Editora Nova Alexandria toda sexta-feira.
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