Quem sou eu?

Danka Maia é Escritora, Professora, mora no Rio de Janeiro e tem mais de vinte e cinco obras. Adora ler, e entende a escrita como a forma que o Destino lhe deu para se expressar. Ama sua família, amigos e animais. “Quando quero fugir escrevo, quando quero ser encontrada oro”.

UMA NOITE QUALQUER...Por Danka Maia










Sugiro a leitura com a melodia instrumental "Por Uma Cabeza"


Toda mulher é uma rainha. Cedo ou tarde todas se dão conta disto.

Essa não é mais uma história de uma pobre coitada com pouca ou nenhuma oportunidade na vida.

 Mas não é mesmo!

 Susete estava em seus cinquenta e poucos anos, mãe de Ricardo e Mariana, avó de Lucas, Tiago, Gabriela e Teodoro, esposa Valente. Adorava a família, porém sentia falta de por um instante sentir-se livre. Era como se algo faltasse em sua alma,como se naquele preciso segundo morresse não teria vivido tudo intensamente como fez com nas demais partes de sua vida. Susete sentia a ausência de liberdade. E não confundam liberdade com libertinagem. A dona de casa de todo dia não queria um amante, um caso ou um amigo, era tanto amada quanto amava, somente alcançava o brilho do fulgor que só a liberdade pode nos proporcionar. E no seu caso em especial, atendia pelas oscilações que o corpo adora obedecer: A dança.

_Poxa Valente, vamos sair. Jantar? Que me diz?

Valente era torneiro mecânico naval aposentado, conhecera o mundo, nenhum local tornara-se mais atraente aos seus olhos que não o sofá da sua sala que a vida inteira decorou e pouco desfrutou do pobre. Não entendia muito bem porque a esposa sentia tanto essa vontade de bater pé por ai, no entanto, a venerava e satisfazê-la era sim um ponto importante para ele.

_Oh Susete, liga lá para  suas amigas, a Ida e Tina ,quem sabe elas não se animam. Sabe o trio ternura não se arrisca a uma aventura não é paixonete?-Deitando no bendito divã outra vez remoendo amendoins torrados, vício que adquirira desde o tempo que esperava horas a fio nos saguões dos aeroportos de sua existência. Susete suspirou um tanto desanimada a o mesmo tempo compreendida pelo parceiro de vida. Marcou com as "meninas" na velha e tradicional confeitaria Colombos no Centro do Rio.

_Ai que essas golousemas descem pela minha boca,embriagam nos meus sentidos e...

Ida concluiu soltando uma gargalhada acompanhada de Susete:

_E vai direto para seus quadris de onde nem com reza braba sairá!

_Só mesmo fazendo campanha de libertação no bisturi do Doutor Medeiros!-Susete finalizou  deliciou-se com a farra.

_Ai vira essa boca para lá Ida. -resmungou Tina batendo três vezes na charmosa mesa e confessando:

_O Afonso reclama até hoje daquela lipo que implorei e o fiz pagar até mês retrasado! Unha de fome de uma figa! Trinta anos de casado e ainda se acha no direito de fazer reclamações.

 _Devia agradecer por você não coloca-lo na justiça do trabalho isso sim! -Ida estava incontrolável.-_trabalho escravo? Causa ganha na certa!

Mas Susete ficou ausente com um olhar perdido entres as ambrosias e a fatia da torta de pêssegos que tanto apreciava.

_Su,que houve?-quis saber Tina.

 _É! Estamos escarnecendo o marido da amiga e você se perde na terra do nunca!-reclamou Ida.

 _Não crianças, apenas estou divagando. Achei que com filhos criados e encaminhados, netos curtidos teria Valente só para mim. Agora noto que traçamos metas diferenciadas para envelhecermos juntos.

_ Ihhhh...Já vi tudo! Resmungou Ida. -Ele entrou na fase do tórrido caso de amor entre o sofá e a bunda dele ,não é?

_Credo Ida!-replicou Tina. -E isso é jeito de falar do...

Ida mandou:

_Do rego do outro?

 _Eu não tenho tanta petulância!

E mais uma vez formou-se a calorosa discussão entre as duas amigas de Susete.

_ E eu não sei disso Tina? Por seus talentos herdados da falecida sua mãe, que Deus a tenha em bom lugar e bem longe de mim, estaria transando com Duarte até hoje com um lençol e um buraco no meio.

 Gargalhando e arrancando um riso de Susete.

_Também não foi bem assim! -Tina quis justificar-se.

_Que não foi!Quem te ensinou a virar lagartixa na cama para ele fui eu,me poupe madre Tereza do Méier!

Ida prosseguiu filosofando para Susete:

_Amiga linda de bonita do meu coração. A equação é simplíssima: HOMEM+SOFA+APOSENTADORIA: MULHER COM LACRE DE NOVO!

 Tina protestou:

_Tá maluca praga? Quase 40 anos de casamento a Susete se tornar virgem de novo?

_Se ficar só donzela de novo se dê por satisfeita filha,outro dia li na internet um caso de uma mulher que numa dessa acabou com a dita-cuja toda colada.

_O que? -Susete se acabou em riso.

 _Ida isso é loucura!-Protestou Tina outra vez concluindo:_Gente, virou tudo uma coisa só por acaso?

_Estou falando para vocês que  li,a perseguida da mulher de vagina virou MONOGINA! Uma coisa só! Susete agiliza o processo amada, se não nunca mais verás o bicho de um olho só do Valente!

E ai as três desabaram nos ares da graça.

Na volta para casa, olhando as luzes da cidade num início de noite no banco traseiro do taxi,Susete se pôs a refletir sobre tudo aquilo e rememorando ate soltou outros risadas que fizeram o motorista fita-la pelo retrovisor.

_Desculpe senhor. -disse modesta.

_Que isso senhora, rir é o combustível da alma.No meu caso o Tango é o meu combustível.

E aquela palavra acendeu uma antiga fagulha dentro de Susete.

_Tango?

_Ah sim eu adoro dançar um Tango as terças e sextas na Lapa.

_Que maravilha! Amo dançar, na mocidade até me arrisquei durante um tempo,e o tango também era um de minhas preferências.Mas sabe como é a vida,veio casamento, filhos, e a gente vai seguindo e se perdendo de quem somos para sermos aquilo que também sonhamos sem imaginar a ausência que pode causar no ser o que realmente nos completa:Nós mesmos!

_A senhora não gostaria de visitar a Estudantina?-indagou o motorista num tom de convite, e após vinte hora de conversa e apresentações devidamente feitas, paga a corrida que acabou saindo pela metade que o taxímetro marcara, Susete tinha um nova visita  a fazer pelo seu mais novo amigo Artur, vulgo Tuco,o taxista.

Ela jamais chegou em casa tão esfuziante.

_Valente! Paixonildo! Gostoso de minha alma!- Os gritos enchiam o silêncio da casa e da alma da dona de casa,porém,o maridão jazia no terceiro sono nos braços de Morfeu.No outro dia contou tudo a ele com uma empolgação de 15 anos de idade.

_Paixonete, o que vai fazer num salão de  dança criatura?

_Paixonildo vamos! Por favor!- Implorando-o com as duas mãos cerradas.
_Susete, embora não compreenda essas tuas necessidades descabidas, até tento respeitar. Se quiseres ir vá, tens minha benção!- volvendo ao sofá de novo o que a fez lembrar-se do romance do traseiro dele como o canapê em questão como abordada Ida.

E como ele dera o aval, lá foi à sonhadora em busca de liberdade. Fez amigos, desabrochou o corpo agora amadurecido para o bailado.

Lá encontrou Heitor, seu professor, um argentino feliz e movido pelo tango e a primeira lição que a ensinou foi:

_Susete,o tango precisa ser visto como aquela dança de uma noite qualquer onde você jura que não vai acontecer nada que te absorva, surpreenda ou encante. Mas, ao baila-lo entenda-o como se fosse à última vez que poderá desfrutar de tal prazer.

 A desenvoltura e paixão que a tomava era tanta que levou o professor convida-la para uma Milonga,ali mesmo na Estudantina na noite seguinte.A habilidade dela era tamanha que a intitulou a melhor aluna da classe.

Susete aceitou sem pestanejar, chamou todos. Marido, filhos, amigas, no entanto no dia e hora questão sabe quantos estavam? Nenhum deles. Valente tinha a final do time de futebol e era óbvio que  encontro com o sofá já estava deveras marcado, os filhos tinham outros compromissos, os netos estariam na hora de dormir, Ida viajara dias antes para casa da filha em Curitiba e Tina encontrara-se com um bueiro que lhe deixou a perna esquerda quebrada o repouso tornara-se sua  palavra de ordem.

     E cá entre nós quem nunca viveu um momento como esse?
 Quando só queremos a presença, o apoio incondicional de quem amamos e tudo que recebemos com ou sem intenção é o olhar vazio no meio do salão. O coração da dona de casa disparou, as pernas bambearam, e ficou refletindo no que era o a dança que apresentaria com Heitor. O Tango mescla o drama, a paixão, a sexualidade, a agressividade, é sempre e totalmente triste. Como dança é "duro", masculino, sem meneios femininos, a mulher é sempre submissa. O ritmo é sincopado, tem um compasso binário. A síncope é de uma nota tocada no tempo fraco que se prolonga até um tempo forte, o que movimenta a música e desloca acentuação do ritmo. O professor aproximou-se dela e sabendo de tudo foi leve  e sábio:

_ Susete , tiempo para ser libre y lo que es más hay una noche más.

Imediatamente ela sorriu e acenando a cabeça concordou e repetiu agora para si,dentro da alma:

_Hora de ser livre em uma noite qualquer!
  E a conduzindo delicadamente pela mão até o centro onde o foco de luz se ascenderia sobre os dois, ela num lindo vestido rubro um pouco mais longo atrás, justo, mas de modo comedido, com meias pretas transluzentes que torneavam suas pernas deixando-as mais belas que de costume  iniciou-se o Tango Por Una Cabeza.


ATENÇÃO CARO LEITOR:
DAQUI EM DIANTE MINHA SUGESTÃO É QUE A LEITURA SEJA DEGUSTADA AO SOM DA BELÍSSIMA MELODIA EM QUESTÃO,COM UM VINHO FICA MUITO MELHOR...
"Por Una Cabeza(Instrumental)

Escolhido a dedo por Susete,lembrança do filme estrelado por Al Paccino-Perfume de Mulher seu predileto,onde mostra que pessoas simples,importantes,cegas,surdas,lindas ou feias podem e devem vivenciar o doce prazer que a liberdade nos dá, e agora chegara a sua ocasião de deliciar-se nos braços dessa liberdade, por ela tão desejada.


                                                            Perfume De Mulher

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Heitor deslizou suas mãos  pelo seu ombro até a cintura e no primeiro  lance maior da nota do violino a trouxe rente ao seu corpo, começando aquela Milonga com um ABRAZO (abraço), anel formado pelo braço direito do homem em volta das  costas da mulher, o esquerdo da mulher em volta do  pescoço do homem e  esquerdo do homem e direito da mulher unidos pela mão.
 Requisito indispensável  para a dança de tango.

Enfim, Susete era mais feliz,bela e jamais fora tão livre!

Então  veio o ADELANTE (em frente),A frente do homem  ADORNO (enfeite),uma graça que se acrescenta com um ou ambos pés, de modo  individual, em pausa ou movimento,uma típica decoração.Ao completar este ciclo, veio o tão esperado ADAGIO (do italiano, lento).
A continuação de oscilações amplas realizadas sobre um tempo lento.
 Movimento de cenário, de caráter pausado, usado para intensificar a sensualidade. Quando a mulher o aproveita para  acariciar com sua perna a perna do companheiro. A sequência maravilhava os poucos expectadores que ali apreciavam aquele belo espetáculo para Susete era como se no mundo não houvesse nenhuma outra mulher, somente ela e totalmente dona de si.




Pensava consigo: Voar sempre, cansa -por isso ela corre em passo de dança.


Vieram a AGACHADA, corte com que conclui um giro e consisti em aproximar-se do piso horizontalmente, a AGUJA (agulha), se fala de quando o homem pisoteava enquanto a mulher  gira ao seu redor, e define com lápis.
 Susete afastou encenando fielmente AMAGUE (amargurar-se), que é aspecto arrependida e caída.Heitor a colheu  com  uma APERTURA (abertura),passo que se dá sem cruzar uma perna sobre outra nem juntar os pés.E ARROJE (arremesso) quando o homem estende os braços e expulsa a  mulher a maior distância, geralmente para levar-lhe ao cruzamento ou propor o  início de um giro.Que veio e foi sensacional, o módico público foi ao delírio.Susete amava,sentia e sofria por estes instantes não vividos.Esquecendo do trivial dançar é sentir, sentir é sofrer, sofrer é amar. Se você ama, sofre e sente. Não espera:Dança!

Bailan tango y se mueven .jpgE quando o último acorde do violino calou-se Susete viu que toda vez que carecesse ir aquele Reino onde era Rainha plena e eterna tudo que precisava fazer era simplesmente não dançar, mas entregar-se ao desejo de ser livre, ou como disse Friedrich Nietzsche: "E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música e descobrir onde mora a verdadeiro espírito de liberdade."

 Beijocas Galera!





























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11 comentários:

  1. Danka!!!
    Uma Susete que gosta de dança de salão...
    Adorei!!!
    O conto é fantástico. Conta essa solidão que sentimos por vezes quando desejamos realizar-nos além dos desejos dos que nos rodeiam...
    Beijinhos, querida!

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  2. George Matos- Campina Grande
    Danka..De novo você me deixa emocionado e sem palavras!
    Simplismente Maravilhoso!
    Beijos Mil!

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  3. Dulce Moarais....Sim,me inspirei na "nossa" Susete e seu amor a dança para intitular a personagem,mais que merecido sim!
    Obrigada Amiga!
    Beijocas!

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. George Matos
    Obrigada por sempre ser tão doce e carinhoso comigo e com meus escritos.
    Beijocas!

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  6. Juliana Laureano Simplesmente M A R A V I L H O S O!

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  7. Danka, conheço uma Susete que também gosta de dançar tango e que até já dançou "Por una cabeza" :)

    Só ainda não se aventurou numa milonga assim, mas quem sabe ela se sente desafiada por essa homónima! ;)
    Muito obrigada por este conto, Danka, toda a música dele fala comigo, nas linhas e nas entrelinhas da pauta e nos tempos e contratempos do tango!

    "Susete , tiempo para ser libre y lo que es más hay una noche más." - Muchas noches! :)

    Um beijinho, Danka!

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  8. Marlene Diógenes-SP Danka nunca dancei,mas ao ler este conto deu vontade,além disso,imaginei cada tempo,cada passada,e pensei:Talvez eu seja mais uma Susete tentando se encontrar? Lindo!Lindo! Cada vez mais prazer em ler qualquer escrito que tenha elaborado.Beijos Machine!

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  9. Este comentário foi removido pelo autor.

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