Quem sou eu?

Danka Maia é Escritora, Professora, mora no Rio de Janeiro e tem mais de vinte e cinco obras. Adora ler, e entende a escrita como a forma que o Destino lhe deu para se expressar. Ama sua família, amigos e animais. “Quando quero fugir escrevo, quando quero ser encontrada oro”.

Escuridão – Capítulo III

Arte: Autor desconhecido

Escuridão – Capítulo III 

A noite continuou a preencher a sua visão, deixando cada vez menos luz. A bengala-guia foi comprada, o pequeno apartamento apetrechado com os aparelhos que lhe iriam facilitar o quotidiano. As pontas dos dedos ainda não se tinham habituado às letras inventadas por Louis Braille, mas aprendiam aos poucos. Já encontrava as marcas gravadas nas moedas quando ia tomar café para deixar o troco em cima da mesa. Também já conseguia identificar o pacote de leite e distingui-lo do de sumo de laranja. Descobriu que, afinal, ainda podia ler. Claro, não era com os olhos, mas com os ouvidos. As gravações em CDs de obras literárias eram poucas e nem sempre encontrava disponíveis os textos que queria descobrir, mas a sua mãe, que tinha a particularidade de ter sido dotada de uma voz encantadora, dedicava os seus serões a gravar, num pequeno aparelho que adquirira para o propósito, os livros mais recentes que sabia que a filha iria gostar. Foi assim que a sua coleção de livros foi crescendo e que lia ainda mais do que no passado. É verdade que, quando podia ver, a leitura era uma atividade que exigia uma concentração dirigida exclusivamente para as páginas imprensas. Agora que ouvia livros, podia ao mesmo tempo aquecer a água para o chá ou pentear o cabelo, concertar as almofadas do sofá ou limpar a mesa. 

Uma manhã, ao acordar, compreendeu que a cor tinha desaparecido da sua vida. O calor do sol que entrava pela janela aquecia o seu rosto mas ela não podia já distinguir as partículas de luz. Já estava preparada há muito para esse dia e não se assustou. Ficou só triste, e chorou. Não acusou a vida. Não acusou o destino. Nem a má sorte. Nem a doença. Chorou de saudades. Chorou da ausência da beleza das imagens que jamais poderia rever. E acalmou. Lembrou-se das viagens, do encanto das cores que guardaria na sua memória por relembrá-las com frequência para as manter vivas. E fez o seu filme privado, na sua mente, composto das maravilhas que vira nos meses anteriores. Voltou a dormir, cansada pelas emoções que tinha vivido, sem mesmo sair da cama. Quando acordou, não sabia que horas poderiam ser. Encontrou às apalpadelas o relógio especialmente concebido que lhe permitia saber as horas com o toque e descobriu que já passavam das onze da manhã. Lentamente iniciou a sua nova vida na escuridão. 

Continua no dia 14 de outubro...

Dulce Morais
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10 comentários:

  1. Continuo presa a esta personagem e ao seu drama!

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  2. Uma personagem que aprende a ser forte . Gostei muitoooooooo. Até dia 14.

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    1. Aprende ou já o era sem saber :)
      Até dia 14!
      Beijinhos!

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  3. Estou ansiosa para saber mais, Dulce. Adorando!

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  4. Dulce... antes de postar este comentário fui até o fundo do quintal de olhos fechados e voltei para poder visualizar melhor o drama do personagem. O tato e a audição fica em evidência e descobri que a batida da perna em um banquinho no meio do caminho é muito doloroso para quem não o vê rsrsrsrsrs.
    Enfim ...verdade é que ainda não consigo " ver " o final desta história e aguardo ansioso o próximo capítulo. Parabéns e abraços !

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    1. Sandro,
      Experiências como a que você fez existem, pelo menos noutros países em que vivi, para ajudar os familiares e assistentes de deficientes visuais a compreender o que eles vivem para melhor poder ajudá-los no quotidiano. Apenas duram mais tempo que um passeio ao fundo do quintal :)
      A história ainda terá algumas surpresas e espero que continuará a ser do seu agrado!
      Muito obrigada e abraço!

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  5. Minha amada amiga Dulce..."Lentamente iniciou a sua nova vida na escuridão. " Não tem ideia de como esta frase me definiu mesmo lendo até aqui toda história.
    Parece uma antagonia,mas quando passamos, além de possível podemos até de certo modo entender como "normal" mesmo que não comum.Estou nesse momento, aqui quero acompanhar o final deste drama e na vida, mais atenta aos sons, ruidos, pessoas e tudo que por crer que por tem um dos sentidos possa me dar vantagem seja por ventura minha desventura.Amei! Amando! Amada! Beijinhos!

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    1. Querida Danka,
      Em breve virá o penúltimo capítulo e espero sinceramente que ele possa fazer "sentir" o que vive a personagem.
      Contar com a sua leitura é uma imensa honra.
      Grande abraço!

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