Na calada da noite, uma mulher está sozinha sentada junto a uma roda de oleiro. Uma velha “vitrola” em seu apartamento muda o disco, e “Unchained Melody” dos Righteous Brothers invade a sala. Seu namorado, seminu, chega perto, senta atrás dela e estende a mão, estragando acidentalmente seu vaso. Não faz mal - juntos eles fazem outro, as mãos dele se entrelaçando nas dela, modelando o barro molhado. Ele começa a beijá-la e ela se joga em seus braços, a roda de oleiro abandonada no calor da paixão.
Demi Moore e Patrick Swayze se dedicam à olearia (Everett) 
Com certeza isso parece ridículo no papel - mas na tela grande, em 1990, com Demi Moore e Patrick Swayze nos papéis do casal sujo de barro, era pura magia. É nesta cena que todos pensam, quando se lembram de Ghost, o romance sobrenatural que estreou nos cinemas há 25 atrás, esta semana. O filme estrelava Moore como a artista Molly, e Swayze como seu namorado banqueiro Sam, que morre em um assalto, e que precisa encontrar uma maneira de comunicar-se com Molly, do além. A cena da cerâmica aparece logo no começo do filme, antes da morte de Sam, e mostra à plateia tudo o que eles precisam saber sobre a paixão entre essas duas pessoas. Como na maioria dos grandes momentos do cinema, a cena aconteceu por uma combinação de trabalho sério e felizes acidentes. “Nós não fazíamos ideia que a cena iria se tornar a cena de amor mais famosa da história,” Patrick Swayze disse em um extra de DVD de Ghost. “Nós éramos apenas atores tentando fazer o melhor trabalho do mundo.“ Aqui está uma breve história da cena que fez milhões de pessoas pensarem, por um instante apenas, em fazer cerâmica como hobby.
Assista a cena de olearia de Ghost.
Quando o roteirista Bruce Joel Rubin imaginou a personagem Molly pela primeira vez, ele pensava nela como escultora em madeira na mesma veia de Marisol, uma artista dos anos 60. “Eu a imaginei com esses enormes blocos de madeira e grandes martelos, atacando a madeira com muito poder,” relembrou Rubin em um extra de DVD, sobre a cena. Mas o diretor Jerry Zucker estava com medo que a ideia fosse “um clichê.” Durante uma sessão de soundtrack para sua comédia de 1988, Corra que a polícia vem aí!, Zucker reparou que um dos editores de som lia uma revista de olearia, e ele teve a revelação de que Molly deveria trabalhar com barro. Rubin gostou da ideia, e já que sua esposa trabalhava com barro, ele não teve dificuldade para reescrever o roteiro. (Mal suspeitava ele, no entanto, que estava prestes a se colocar na mira de uma vida inteira de piadas picantes. “Agora, quando as pessoas vêm à minha casa e veem o estúdio de olearia, eles piscam para mim, como quem diz ‘ah, agora já sabemos o que você faz de noite,’” Rubin disse ao Chicago Tribune em 1991.) Molly virou uma escultora de barro, e a cena de olearia emergiu.
Para se preparar para o seu papel, Moore fez algumas aulas de cerâmica. “Eu só queria que meu vaso não oscilasse,” ela contou em um extra de Ghost. “Isso era o sinal certeiro de que eu não sabia o que estava fazendo, e de que eu estava fingindo.” Swayze não recebeu nenhum treino formal, mas ele se sentou à roda para ensaiar a cena com Demi - e foi aí que Zucker teve a primeira noção de como a cena final poderia ser.
“Quando ensaiamos, eu me lembrei de que a cena era sensual o suficiente para envergonhar um pouco Patrick e Demi, quando a estavam representando,” Zucker disse no comentário de DVD de Ghost. “Eles estavam os dois vestidos… mas mesmo assim… mesmo assim, havia alguma coisa que tornava a cena sensual.”
No dia das filmagens, os dois atores e uma pequena equipe filmaram em um set fechado. Oleiros profissionais estavam à disposição e eles iniciaram alguns dos potes na cena, que Demi completou depois, em câmera. Mas trabalhar com a roda de oleiro provou ser desafiante, de um ponto de vista técnico. “Muitas filmagens são com coisas caindo e espalhando,” Zucker admitiu. A designer de produção Jane Musky relembrou o desafio de conseguir “aquela umidade certa, que fosse sensual, mas que não espirrasse no rosto dos atores.”
Swayze disse que a sujeira não o incomodou. Na biografia Patrick Swayze: One Last Dance, de Wendy Leigh, ele foi mencionado como dizendo “Ficar cheio de barro nos meus braços - isso foi muito sexy. Meu sangue definitivamente ficou mais quente.”
Também aí, Swayze admitiu que ele acha que filmar cenas de amor é muito estressante. “Eu sempre senti uma pressão extra, pois era esperado que eu iria ser o Sr. Sexy, se acreditarmos em todas as revistas,” Swayze escreveu em suaautobiografia Time of My Life . “De todas as cenas que alguma vez filmei, as cenas românticas provavelmente são as que fiz com menos confiança. Por isso, é irônico que seja o clipe de Demi e eu, na roda de oleiro, uma das cenas mais famosas de toda minha carreira.” Na biografia de Leigh, ela revela que Swayze ensaiou a cena de Ghost com sua esposa Lisa Niemi, para conseguir superar seu constrangimento. Mesmo assim, Demi Moore disse que “a face de Patrick ficava um tomate quando a gente falava da cena [de amor].”
Também Demi sentiu-se constrangida durante as filmagens - especialmente quando a cena com o barro transitou para uma sessão bem quente. Em uma entrevista em 1991 à People, ela contou que fazer a cena com Swayze “parecia igual estar na escola, saindo com um rapaz pela primeira vez. E aqui tivemos que agir como se nos conhecêssemos bem, e estivéssemos confortáveis um com o outro. Estávamos armados. O rosto dele estava vermelho como uma beterraba! Eu dizia ‘Por favor, não deixe meu seio ficar exposto.’ E ele respondia, ‘Okay.’ Se ele notasse minha blusa subindo, ele a puxava para baixo. Até que nós finalmente dissemos 'Estou muito nervoso e odeio isso.’ E então tudo ficou bem.”
Ghost (Everett)
E mesmo assim, ficou claro para todos os presentes que Patrick e Demi eram magia na tela. Um dos momentos mais interessantes - quando Patrick estende a mão para ajudar com o vaso e acidentalmente o derruba - não foi planejado.
“Ninguém esperava [que o vaso] caísse,” disse Rubin. “Demi recuperou tão depressa… Ela não estava brava, ela não ficou decepcionada. De certa maneira, toda a natureza daquele relacionamento ficou claro naquele momento.“
O calor da cena de amasso também foi mais intenso do que qualquer pessoa poderia imaginar. “Esse foi um daqueles momentos em ambas as nossa carreiras em que algo aconteceu, e tomou conta de nós,” disse Swayze. Ele escreveu em sua autobiografia: “Demi era muito boa nessas situações. Ela era muito calorosa - bem mais calorosa do que em qualquer das outras cenas que filmamos juntos. Ela mostrou uma vulnerabilidade muito atraente e isso passou muito bem para as filmagens.” A filmagem ficou tão sensual que, depois de ver o resumo diário, Zucker decidiu não filmar uma cena de sexo mais explícita que estava no roteiro. (Nessa mesma sequência, Molly e Sam deveriam fazer amor debaixo de um lençol que cobria uma das esculturas de Molly.)
Esta decisão de cortar a cena levou a um erro de continuidade que os fãs até hoje relembram: Entre a roda de oleiro e a sessão de amasso, as mãos cobertas de barro do casal ficam magicamente limpas. No comentário de DVD, Zucker não se desculpa. “Eu simplesmente assumi que era um corte de tempo, que eles não saíram direto da máquina e foram para o bem-bom,” ele disse. Depois, ele acrescentou, “Na verdade, eu não assumi nada. Eu só queria que as mãos não estivessem cheias de barro.”
Um dos outros elementos essenciais da cena, claro, é a música - uma contribuição da produtora Lisa Weinstein, que trouxe para Zucker uma fita cassete de "Unchained Melody” durante as filmagens. “A saudade naquela música, a dor que ela contém, é maravilhosa,” disse Zucker. Por coincidência, o cantor Bill Medley dos Righteous Brothers também cantou “Time of My Life,” a música de tema do maior sucesso de Swayze antes de GhostDirty Dancing, de 1987“Acho que vamos ter que fazer um dueto em breve, ou algo assim,” Swayze brincou em uma entrevista em 1990.
O próprio Medley teve uma grande projeção na carreira graças a Ghost. Escrita para o esquecido filme de prisão de 1955, Unchained (e daqui vem o nome da música) e gravado pelos Righteous Brothers em 1965, “Unchained Melody” voltou a ser um sucesso em 1990, alcançando a posição nº 19 no Billboard Hot 100. E ainda mais impressionante: Medley passou a ser um cara “maneiro” novamente. “Meus filhos tinham cerca de nove e dez anos na época, e de repente eu me tornei o herói da vizinhança,” ele contou à Rolling Stone em 2003.
Ghost foi um sucesso enorme - o filme com maior bilheteria global em 1990, ultrapassando Esqueceram de mim e Uma linda mulher — e a cena de olearia virou um ícone instantâneo. Desde então, a cultura pop transbordou com paródias e homenagens; cenas falsas de olearia foram incluídas no filme Corra que a polícia vem aí 2 ½ (dirigido pelo irmão de Jerry Zucker, David), em Family Guy , Glee,Two and a Half MenCommunityLate Night with Jimmy Fallonsó para nomear alguns. Um repórter do Iowa virou sensação dois anos atrás, quando imitou a cena durante uma entrevista ao vivo em um estúdio de cerâmica em Cedar Rapids. A cena de Swayze e Moore é frequentemente citada como uma dos momentosmais sensuaismais românticos do cinema, de todos os tempos.
Um professor de olearia explica sua política de tolerância zero Ghost’” neste clipe de Community:
Antes de falecer, vítima de câncer no pâncreas, em 2009, Patrick Swayze falou com orgulho da cena de olearia. “Eu fiquei feliz - e aliviado - de como a cena ficou,” ele escreveu em sua autobiografia. “Demi e eu conseguimos capturar um momento entre essas duas pessoas que fez com que tudo o que aconteceu mais tarde na história, ficasse mais doloroso e emotivo.”

Fonte:yahoo