Bartira vivia com suas filhas Onófra e
Amélia numa fazenda onde era cozinheira. Morava numa pequena casa feita de
barro e folhas de bananeiras como pagamento além do direito de uma cambuca de
leite diariamente. Bartira era descendente direta do Quilombo de Zumbi dos Palmares.
Era comum conversar com as meninas em Orubá, língua nativa de seus pais e avós,
do mesmo modo também muito comum no fim da tarde depois de voltar da casa
grande, apanhar os mesmos livros abandonados no celeiro e com a permissão da
Sinhá Joaquina leva-los para seu casebre e ler com suas filhas, um regalo que
aprendera com sua antiga ama, avó da sinhá, que a ensinou ler e escrever.
Houve um dia que uma das meninas,
Amélia, perdeu a hora e foi apanhar o leite que tinham direito, muitas vezes o
único alimento até que sua mãe voltasse da cozinha da sede á tardinha. No
entanto, havia outra regra, a Sinhá Joaquina só permitia que o resto do leite
fosse dado-as sem a sua presença, uma vez que era comum que a senhora
cavalgasse e depois seguisse para o curral para beber sua fresca caneca de leite.
Porém, naquele dia Joaquina deu de cara com a garota, que imediatamente abaixou
a cabeça como sinal de hierarquia.
_Ô José, eu já não lhe falei que não
suporto dividir meu território com essas crianças remelentas de
"menas" cor? O que essa menina faz aqui?- Num tom nada amigável e
visivelmente irritadiço.
_A Sinhá me perdoe. - Respondeu o moço
preocupado, despachando logo Amélia que voltou chorando para casa, sentida,
humilhada e com sua cambuca de leite que se misturou as lágrimas tão dolorosas.
Ao chegar, deixou o recipiente em cima
da pia improvisada pela mãe deitou-se em sua cama feita de colchão de folhas de
bananeiras e pranteou abundantemente. Por coincidência naquele dia também a mãe
voltou para casa mais cedo. E quando Bartira viu e ouviu a história da filha a
acalmou com aquele jeito que só mãe tem, só colo de mãe possuí só palavra de
mãe tem o poder de consolar o nosso coração. Depois de apaziguar a filha, olhou
dentro dos olhos e disse a pequena Amélia:
_Filha, não deixe que uma palavra como
essa derrube seu coração.
_Mas mamãe a Sinhá me humilhou por minha
cor?
_Ela tentou, mas sem êxito, pense.
_Como assim?
A mãe sorriu e continuou:
_Na frase: Crianças de "menas"
cor. O que realmente está errado? O fato de referir-se a nós como uma sub-raça
por sermos negras ou o fato em que ela sendo uma Sinhá, cheia de cultura e
conhecimento não saber que não existe a palavra "menas " e sim e somente menos? Quem realmente seria uma pessoa
de menos nessa história? Tanto por conhecimento como por atitude?
Amélia alcançou onde a mãe queria chegar
e deixou seu coração livre outra vez.
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